sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Papo de técnico

O futebol é a metáfora da vida, já ensinaram os cronistas do passado, Pois tudo o que está em jogo toca a alma humana: o desejo de vencer, a ambição, a glória e o fracasso. Por isso o futebol envolve tanto. É o espaço trágico e cômico da catarse dos sentimentos mais primitivos do torcedor. Mas ultimamente a prática futebolísitca vem perdendo o sentido de drama. Tudo se tornou mais complexo e relativo. E isso não ocorre por causa da torcida, e sim das equipes. São elas que separam o discurso da realidade em campo.

Os treinadores ensinaram os jogadores a falar como autômatos que fizeram cursos de gerenciamento corporativo, em especial os de gestão de pessoas. O pioneiro foi Vanderlei Luxemburgo. Foi ele que lançou no início dos anos 90 a neurolinguísitica aplicada à bola. A neurolinguísitca é um ramo da psicologia comportamentista, que reduz o ser humano à condição de roedor facilmente manipulável. E as teorias gerenciais que se seguiram derivam da mesma mentalidade, hoje tão comum no mundo das empresas. Não é por outro motivo que os técnicos dão palestras de autoajuda para gerentes de banco e fábricas de carro. O resultado é obviamente o mais completo autoengano.

Algumas declarações soam ridículas pelo artificialismo. É como se todos tivessem passado por uma lavagem cerebral e, pior, querem arrastar os torcedores à mesma condição. Treinadores e jogadores rezam por idênticas regras fixas do manual de inteligência emocional. Eles reconhecem a força do adversário, por pior que seja. Para o próximo jogo, admitem que têm chances iguais ou até menores de vencer, mesmo que a partida seja contra um timinho. Todos são modestos e só faltam dizer que vão festejar a derrota com a torcida adversária. E tudo foi “previsto no plano”, inclusive os fracassos mais vexaminosos. Todos estão vacinados contra multas e futuras demissões. Afinal, o adversário pode ser o próximo empregador.

Esses profissionais querem que o futebol vire a metáfora da gestão de empresas. Sem saber, planejam matar o futebol. Assistimos à ascensão dos treinadores-gestores e seus geniais subgerentes. Para triunfar, eles precisariam expulsar do campo a realidade. Os times estão cada vez mais esquizofrênicos e não sabem lidar com a sujeira dos gramados. Porque, a despeito da lógica do autoengano, o futebol continua a ser o domínio da barbárie, do palavrão, das pedradas e da violência. Não há palavras hipócritas suficientes para derrotar o acaso... e a vida.

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